Em Conclave (2024), dirigido por Edward Berger (Nada de Novo no Front), o Vaticano é palco de um jogo de poder tão antigo quanto a própria instituição. O filme mergulha no processo secreto de eleição do Papa, revelando as tensões políticas, teológicas e humanas que envolvem os cardeais isolados da Capela Sistina. Com um elenco estelar liderado por Ralph Fiennes e Stanley Tucci, a produção combina o peso da tradição religiosa com a urgência de um thriller político contemporâneo. A trama gira em torno do Cardeal Lawrence (Fiennes), um homem de fé genuína, mas cético diante das manipulações de Bellini (Tucci), um estrategista implacável que vê a Igreja como um tabuleiro de xadrez. Entre debates sobre modernização, escândalos e a pressão por um líder “palatável” para o século XXI, Conclave não apenas expõe as entranhas do poder eclesiástico, mas questiona até que ponto a espiritualidade sobrevive à ambição humana.
Um Duelo de Titãs

Ralph Fiennes e Stanley Tucci são o coração pulsante de Conclave. Fiennes entrega uma performance contida e introspectiva como o Cardeal Lawrence, um homem dividido entre sua fé e as pressões políticas. Sua postura física — ombros curvados, olhar frequentemente baixo — transmite o peso de décadas de serviço eclesiástico, contrastando com a energia elétrica de Tucci. Já Tucci, no papel do manipulador Cardeal Bellini, rouba a cena com diálogos afiados e uma presença que mescla charme e ameaça. Seu Bellini é um político nato, capaz de sorrir enquanto semeia dúvidas, e sua dinâmica com Fiennes sintetiza o conflito central do filme: espiritualidade versus estratégia.
O elenco secundário, embora menos explorado, traz nuances importantes. John Lithgow interpreta o Cardeal Tremblay, um conservador pragmático cuja lealdade oscila conforme os ventos do poder. Já Lucian Msamati, como o Cardeal Adeyemi, representa a voz das periferias africanas, questionando a eurocentricidade da Igreja — um arco subutilizado que merecia maior profundidade. Isabella Rossellini, como a freira Agnes, surge como uma figura enigmática, lembrando aos cardeais a dimensão espiritual de sua missão, mas seu potencial narrativo é apenas esboçado.
Claustrofobia Sagrada

Edward Berger transforma a Capela Sistina em uma personagem silenciosa, mas onipresente. A câmera de Berger percorre os corredores e salões do Vaticano com movimentos lentos e angustiantes, reforçando a sensação de isolamento dos cardeais. A fotografia explora contrastes: a luz dourada das velas ilumina rostos cansados, enquanto a penumbra dos confessionários esconde segredos. Planos detalhados, como as mãos trêmulas de um cardeal ao depositar seu voto ou o suor na testa de outro durante um discurso, humanizam figuras que, de outra forma, pareceriam distantes.
A trilha sonora minimalista de Volker Bertelmann (compositor de Nada de Novo no Front) amplifica a tensão. Sons ambientais — o arrastar de uma cadeira, o eco de passos no mármore, o silêncio sepulcral antes de uma votação — são usados como elementos narrativos, criando uma atmosfera de suspense quase físico.
Acertos e Clichês

O roteiro, adaptado por Peter Straughan (vencedor do Oscar 2025), aborda temas como corrupção eclesiástica, crises de representatividade e os limites da modernização religiosa. Diálogos inteligentes, como o debate sobre “um Papa que entende Twitter” ou a crítica à lavagem de imagem do Vaticano, mostram uma Igreja em conflito consigo mesma. No entanto, o filme tropeça em reviravoltas previsíveis: a revelação de um escândalo financeiro, por exemplo, segue um caminho maniqueísta que simplifica questões complexas.
Personagens secundários, como o Cardeal Adeyemi (Msamati) e o jesuíta interpretado por Brian F. O’Byrne, são reduzidos a símbolos — o africano marginalizado, o intelectual idealista — sem espaço para desenvolvimento. Mesmo assim, o núcleo central entre Lawrence e Bellini mantém o espectador engajado, transformando debates teológicos em jogos de poder emocionantes.
Quando a Tradição Pesa

Apesar de seu elenco estelar, Conclave tropeça em momentos didáticos. Cenas como a explicação detalhada do processo de votação (embora necessárias para o público geral) quebram o ritmo, transformando o suspense em aula catequética. Além disso, a previsibilidade de certos conflitos — como a tentativa de Bellini de manipular votos — frustra quem busca originalidade. O filme também evita explorar nuances delicadas, como a relação entre fé e homossexualidade no clero, mencionada apenas de passagem.
Uma Experiência Única, Mesmo Imperfeita
Conclave é um thriller psicológico eficaz, sustentado por atuações magnéticas e direção imersiva. Embora não escape de clichês, oferece uma reflexão instigante sobre poder e fé. A força do filme está na tensão entre o sagrado e o profano: enquanto os cardeais discutem estratégias, a câmera foca em detalhes como uma hóstia consagrada ou uma cruz pendurada na parede, lembrando que, por trás da política, há algo maior em jogo.
Vale a audiência para quem aprecia dramas políticos com toques filosóficos, mas fãs de histórias eclesiásticas mais densas (como Dois Papas) podem sentir falta de maior ousadia. Conclave não reinventa o gênero, mas cumpre sua missão: expor as sombras por trás da luz divina.
Nota IMDb: 7.3/10
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