Casa de Dinamite (2025): O Míssil Que Acertou a Reputação de Kathryn Bigelow

A expectativa que pairava sobre Casa de Dinamite (2025) era quase palpável. Afinal, a união da mestra do suspense Kathryn Bigelow com um elenco de peso para abordar a paranoia nuclear na Casa Branca prometia um novo clássico do thriller político. No entanto, o que nos foi entregue é um exercício de frustração, um filme que não apenas falha em honrar o legado de Bigelow, mas que se estabelece, sem sombra de dúvida, como o ponto mais baixo da (agora podemos chamar assim) “franquia” de dramas de tensão política da diretora.

O filme se propõe a ser um mergulho claustrofóbico e em tempo real na Sala de Crise, após o lançamento de um míssil não rastreável em direção ao território americano. A premissa, por si só, é um convite ao desespero e à reflexão sobre o poder e a moralidade em seu estado mais bruto. Contudo, a execução é um labirinto de decisões narrativas equivocadas que diluem a tensão até o ponto da indiferença.


A Narrativa Fragmentada e o Efeito Colateral da Repetição

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A principal virtude que o filme tenta ostentar é, ironicamente, seu maior defeito: a estrutura de “narrativa em flor” (ou narrativa fragmentada). A ideia de revisitar os mesmos momentos cruciais através de diferentes perspectivas — a do Presidente, a da Capitã Walker no Pentágono, a do Conselheiro de Segurança Nacional — tinha o potencial de construir uma tapeçaria complexa de desinformação e estresse.

Virtude: Em seus primeiros 30 minutos, a montagem frenética e a alternância de ângulos conseguem injetar uma dose inicial de adrenalina, estabelecendo o cenário de caos e a urgência da situação. A fotografia de Barry Ackroyd, embora mais contida do que em trabalhos anteriores, ainda consegue capturar a frieza opressiva dos ambientes de alta segurança.

Defeito: A partir do segundo ato, a repetição se torna um fardo insuportável. O mesmo diálogo, a mesma informação crítica, é reencenada com pouquíssima variação, apenas para nos mostrar a reação de um novo personagem. Não há acréscimo significativo de informação ou profundidade psicológica que justifique a redundância. O que deveria ser um estudo sobre a falibilidade da comunicação em crise se transforma em um tedioso loop temporal. A tensão, que deveria escalar, estagna, e o espectador é forçado a reviver a mesma cena de angústia sem que o enredo avance de forma substancial.


Elenco e Atuações: Estrelas Perdidas em Órbitas Vazias

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O elenco de Casa de Dinamite é, no papel, um dos mais fortes do ano, mas a direção de Bigelow, desta vez, parece ter falhado em extrair a performance necessária para sustentar o peso dramático do roteiro.

Idris Elba como POTUS (Presidente dos Estados Unidos) é a âncora do filme. Sua atuação é marcada por uma contenção calculada, um presidente que tenta projetar calma enquanto o mundo desmorona. No entanto, o roteiro o confina a um papel excessivamente reativo, limitando o impacto de sua presença.

O verdadeiro motor da trama deveria ser Rebecca Ferguson como Capitã Olivia Walker, a oficial militar encarregada de rastrear e, possivelmente, interceptar o míssil. Ferguson entrega a intensidade esperada, mas sua personagem é subdesenvolvida, resumida a uma série de olhares tensos e jargões militares. O filme insinua um conflito entre tradição (o protocolo militar) e modernidade (a guerra cibernética), mas a Capitã Walker é apenas um peão na mesa de xadrez, sem a agência dramática que a atriz merecia.

O maior desperdício de talento reside em Jared Harris como Secretário de Defesa Reid Baker e Gabriel Basso como Conselheiro de Segurança Nacional Adjunto Jake Baerington. Harris, sempre excelente, é reduzido a um porta-voz de informações técnicas, e Basso, cujo personagem tem um arco pessoal (sua esposa, Lily Baerington, interpretada por Brittany O’Grady, está na área de impacto), não consegue transcender o melodrama. A tentativa de humanizar a crise com o drama familiar de Baerington soa forçada e artificial, um clichê que Bigelow parecia ter superado em seus trabalhos mais maduros.


Direção e Contexto Temático: A Parábola da Inação

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O que mais decepciona em Casa de Dinamite é a sensação de que Bigelow, conhecida por sua direção visceral e implacável, se contentou com uma abordagem fria e distanciada. O filme se apoia pesadamente em telas de computador, mapas e feeds de notícias, em vez de focar na reação humana crua. A ausência de um vilão claro (o míssil é “não atribuído”) é uma escolha temática interessante, que coloca o foco na burocracia e na incapacidade de resposta do sistema.

O contexto temático central é a aceitação da impotência diante de uma ameaça existencial. O filme questiona a validade da tradição militar e política em um cenário de guerra assimétrica e instantânea. No entanto, a mensagem é entregue com uma mão pesada, e o filme se arrasta em discussões filosóficas superficiais sobre o que fazer, em vez de mostrar as consequências brutais da inação.

A mensagem subliminar, que se torna evidente no final, é a aceitação da morte como o único desfecho possível para a crise moderna. O míssil, que nunca é visto, torna-se uma metáfora para a inevitabilidade do colapso, seja ele nuclear, climático ou político.


O Final Ambíguo e a Mensagem Subliminar

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O final de Casa de Dinamite é o que tem gerado mais controvérsia, e é o ponto de maior decepção para quem esperava uma conclusão à altura da tensão prometida. O filme não oferece um clímax tradicional. Em vez de uma explosão ou uma interceptação heroica, o míssil simplesmente… desaparece.

O último ato se concentra na imagem da chegada em um bunker, sugerindo que o míssil atingiu seu alvo, mas que a tragédia é absorvida pela quietude da aceitação. O míssil não é um objeto físico, mas a materialização do medo coletivo. A mensagem subliminar é clara: a humanidade, presa em sua própria burocracia e medo, já aceitou a morte. O final sugere que a única vitória possível é a paz interior no momento da aniquilação. É uma conclusão pretensiosa e frustrante, que confunde ambiguidade com falta de resolução.

Em suma, Casa de Dinamite é um filme que se afoga em sua própria estrutura e ambição. É uma obra que se leva demasiado a sério, mas que não consegue sustentar o peso de suas próprias ideias. A mestria técnica de Bigelow está presente em lampejos, mas a alma e a urgência de seus melhores trabalhos se perderam na repetição e na frieza calculada.


O Silêncio Ensurdecedor da Decepção

Casa de Dinamite tinha todos os ingredientes para ser um clássico moderno do thriller político, mas se contentou em ser uma parábola pretensiosa sobre a impotência. É um filme que, ao tentar ser profundo, apenas se torna vazio. A decepção é ainda maior por vir de uma diretora que nos acostumou com a excelência.

Nota do IMDb: 6.5/10

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