Frankenstein Além do Monstro: Um Guia Definitivo Pelas Adaptações do Mito de Mary Shelley


Há mais de duzentos anos, durante um verão anormalmente frio e tempestuoso à beira do Lago Genebra, um pesadelo deu origem a um dos mitos mais duradouros da cultura ocidental. A mente por trás dessa visão era a de Mary Shelley, uma jovem de apenas dezenove anos, que transformou um desafio literário entre amigos em “Frankenstein; ou, O Prometeu Moderno”. O que ela não poderia prever era que sua história de ambição desmedida, abandono e a busca por identidade transcenderia as páginas para se tornar um arquétipo imortal. O monstro, tal qual seu homólogo literário, escapou do laboratório de Victor Frankenstein para vagar eternamente em nosso imaginário coletivo, sendo constantemente remontado, reinterpretado e revivido no cinema, na TV e em todas as formas de mídia. Este guia é um convite para explorar essa jornada fascinante, da centelha de vida original até as mais ousadas reinvenções contemporâneas, incluindo a visão de um dos cineastas mais apaixonados pelo gótico: Guillermo del Toro.


Um Guia Cronológico Pelas Adaptações do Monstro


Vamos mergulhar em uma lista essencial de obras que moldaram a percepção do monstro ao longo das décadas. Esta não é apenas uma filmografia, mas uma linha do tempo da nossa relação cultural com esta criatura trágica.


1. Frankenstein (1910)

Frankenstein-1910

Sim, o primeiro não é o de 1931! Produzido pela Edison Studios, este curta-metragem mudo de 16 minutos é a primeira adaptação cinematográfica conhecida. Um tesouro perdido e redescoberto que é fascinante por suas técnicas experimentais para mostrar a criação do monstro, incluindo a queima de um manequim em reverso. É uma relíquia que já mostrava a obsessão do cinema pelo mito desde seus primórdios.

Diretor: J. Searle Dawley

Sinopse Resumida: Uma versão extremamente condensada do romance, focada no ato da criação e no horror subsequente de Victor. A criatura, interpretada por Charles Ogle, já estabelecia uma maquiagem assustadora que influenciaria versões futuras.

Nota IMDb: 6.3/10


2. Frankenstein (1931)

Frankenstein-1931

Este é o filme que definiu o visual do monstro na cultura pop. Com a maquiagem icônica de Jack Pierce e a performance física e comovente de Boris Karloff, a Criatura ganhou parafusos no pescoço, uma testa achatada e uma postura desengonçada. O filme, dirigido pelo visionário James Whale, desvia-se do livro em muitos aspectos (como a famosa cena da menina e a flor), mas captura perfeitamente a atmosfera gótica e os perigos da ciência sem freios.

Diretor: James Whale

Sinopse Resumida: O cientista Henry Frankenstein (mudança do “Victor” original) rouba cérebros e partes de cadáveres para criar vida. Ao conseguir seu intento, ele fica horrorizado com sua própria criação, um ser que, abandonado à própria sorte, desperta pena e terror.

Nota IMDb: 7.8/10


3. A Noiva de Frankenstein (1935)

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Muitos consideram esta sequência ainda superior ao original. James Whale injetou uma dose de humor negro e surrealismo na narrativa, aprofundando a tragédia da Criatura. A cena em que ele aprende a fumar e bebe com um eremita cego é uma das mais tocantes já filmadas sobre o tema da solidão. E, é claro, há o surgimento da icônica Noiva, com seu cabelo em zigue-zague e seu grito agudo.

Diretor: James Whale

Sinopse Resumida: O Dr. Frankenstein é coagido pelo malévolo Dr. Pretorius a criar uma companheira para sua primeira criação. O filme explora a profunda necessidade de conexão da Criatura e culmina em uma das cenas finais mais emblemáticas e ambíguas do cinema.

Nota IMDb: 7.8/10


4. A Maldição de Frankenstein (1957)

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Este filme britânico da Hammer Film Productions revitalizou o gênero de horror em cores e estabeleceu a dupla dinâmica Peter Cushing e Christopher Lee. Enquanto Cushing interpreta um Victor Frankenstein frio, ambicioso e aristocrático, Lee traz uma versão da Criatura mais assustadora e visceral. A estética sangrenta e sensual da Hammer deu um novo tempero ao mito.

Diretor: Terence Fisher

Sinopse Resumida: Numa reinvenção da origem, o Barão Victor Frankenstein usa partes de corpos de criminosos para criar uma nova vida, mas seu plano sai terrivelmente errado quando a Criatura escapa e inicia uma onda de assassinatos.

Nota IMDb: 6.8/10


5. O Jovem Frankenstein (1974)

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Mel Brooks e Gene Wilder criaram a mais genial e amorosa paródia do mito. Filmado em preto e branco e usando os mesmos cenários e equipamentos do filme de 1931, este clássico é uma homenagem de quem realmente entende e ama o material original. A comédia é inteligente, os personagens são inesquecíveis (como o Corcunda Igor, pronunciado “Eye-gor”), e o filme prova que um mito só é verdadeiramente forte quando pode ser também alvo de risos.

Diretor: Mel Brooks

Sinopse Resumida: O Dr. Frederick Frankenstein (herdeiro do famoso cientista) tenta desesperadamente negar seu legado familiar, até que herda o castelo na Transilvânia e se vê tentado a repetir os experimentos do avô.

Nota IMDb: 8.2/10


6. Frankenstein de Mary Shelley (1994)

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Dirigido e estrelado por Kenneth Branagh, este é o projeto mais ambicioso de ser fiel ao livro. Com um elenco estelar (Robert De Niro como a Criatura, Helena Bonham Carter como Elizabeth), o filme tenta capturar a eloquência filosófica do romance e a tragédia épica da história. A maquiagem da Criatura é deliberadamente mais fiel à descrição de Shelley, e De Niro entrega uma performance poderosa e cheia de nuances.

Diretor: Kenneth Branagh

Sinopse Resumida: Seguindo de perto a estrutura do romance, o filme narra a obsessão de Victor Frankenstein, a criação do monstro, seu abandono e a espiral de vingança que consome ambos.

Nota IMDb: 6.3/10


7. Penny Dreadful (Série, 2014-2016)

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Esta aclamada série é um magnífico exemplo de mashup gótico, onde personagens como Dr. Frankenstein, Dorian Gray e Drácula coexistem. A interpretação de Rory Kinnear como a Criatura (aqui chamada de “John Clare”) é uma das mais profundas já realizadas. Ele é um ser letrado, filosófico e profundamente ferido, que vive uma complexa relação de amor e ódio com seu criador, aqui um jovem e brilhante Victor Frankenstein (Harry Treadaway).

Diretor/Criador: John Logan

Sinopse Resumida: Em uma Londres vitoriana sombria, a medium Vanessa Ives une um grupo de pessoas atormentadas para combater forças sobrenaturais. A trama de Frankenstein e sua Criatura é um dos pilares centrais da narrativa.

Nota IMDb: 8.2/10


8. Frankenstein (2025) de Guillermo del Toro

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O cineasta mexicano, um mestre em criar monstros simpáticos, finalmente concretiza seu projeto de paixão de décadas. Com Oscar Isaac como Victor Frankenstein e Jacob Elordi como a Criatura, Del Toro promete uma abordagem que mescla o horror gótico com um profundo drama sobre paternidade e responsabilidade. É a adaptação mais fiel em espírito ao romance, focando na relação trágica entre o criador e a criatura.

Diretor: Guillermo del Toro

Sinopse Resumida: Ainda envolta em certo mistério, a premissa promete seguir o romance de Mary Shelley com a sensibilidade visual única de Del Toro, explorando a tragédia de um cientista que, ao tentar brincar de Deus, se recusa a cuidar de sua própria criação.

Nota IMDb: 7.6/10


Conexões Canônicas e Curiosidades

Frankenstein

Uma pergunta frequente é: essas adaptações se conectam? A resposta é que, em sua grande maioria, são histórias isoladas. Cada diretor pega os temas centrais de Shelley e os reinterpreta. As únicas conexões diretas são as sequências dentro de uma mesma franquia, como os filmes da Universal nos anos 30/40 ou os da Hammer.

Agora, algumas curiosidades que alimentam o mito:

Igor não existe no livro: O assistente corcunda é uma invenção do cinema, popularizado pelos filmes. No livro, Victor trabalha sozinho.

A Criatura é um intelectual: Diferente da versão mudo-grunhida de Karloff, no livro a Criatura é eloquente, aprende a ler sozinha e debate filosofia com seu criador.

Dr. Frankenstein tem nome diferente: Nos filmes clássicos da Universal, o cientista é chamado de Henry Frankenstein. No livro, seu nome é Victor, e Henry é, na verdade, o nome de seu melhor amigo, Henry Clerval.

Del Toro e seu sonho: O diretor tentou adaptar Frankenstein por mais de uma década, tendo até escalado Doug Jones para o papel da Criatura em um projeto que nunca saiu do papel nos anos 2000.


A Vida Eterna de um Mito

A jornada de Frankenstein e sua Criatura é, no fundo, um espelho da condição humana. É uma história sobre a curiosidade que nos move para frente e a ética que deve nos conter; sobre a beleza que adoramos e a monstruosidade que rejeitamos; sobre o profundo medo da solidão e o desejo inato de ser amado. A Criatura de Mary Shelley não é um simples monstro; ela é a criança abandonada, o estrangeiro rejeitado, a consequência não assumida de nossos atos.

Cada nova adaptação, do expressionismo de 1931 ao drama gótico de Del Toro, prova a incrível resiliência desses temas. O monstro nunca realmente morre; ele simplesmente se transforma, sempre refletindo os medos e as ansiedades da sociedade que o recria. Ele é, em sua essência, o nosso próprio reflexo distorcido, assustador, comovente e profundamente humano.

E você, qual dessas adaptações é a sua preferida? Já assistiu a versão de Guillermo del Toro? Conte para a gente nos comentários qual é o seu Frankenstein favorito e por que essa história ainda ressoa tanto com você!

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