Mountainhead (2025): O Espelho Rachado dos Bilionários Tecnológicos na Era da Crise


Em um cenário cinematográfico frequentemente saturado por narrativas sobre riqueza e poder, Mountainhead (2025), a estreia diretorial de Jesse Armstrong (a mente brilhante por trás de Succession) para a Max, chega com a promessa de uma sátira ácida e desconfortável. O filme nos isola em uma luxuosa fortaleza nas montanhas de Utah, onde quatro titãs da tecnologia – interpretados por um elenco estelar que inclui Steve Carell, Jason Schwartzman, Cory Michael Smith e Ramy Youssef – se reúnem enquanto o mundo exterior, em parte moldado por suas próprias inovações, parece desmoronar. A premissa é potente: observar a elite desconectada confrontando (ou ignorando) as consequências de suas criações em meio a uma crise global. A expectativa, alimentada pelo histórico de Armstrong, é de diálogos cortantes e uma análise implacável das dinâmicas de poder. Mas será que Mountainhead consegue sustentar essa promessa ou se perde em seu próprio cinismo?


A Montanha Russa de Diálogos Afiados e Ritmo Inconstante

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A força motriz de Mountainhead reside, inegavelmente, nos diálogos. Armstrong transporta sua habilidade singular de Succession para a tela grande, criando trocas verbais que são, ao mesmo tempo, repulsivas e magneticamente divertidas. A linguagem dos personagens é um vernáculo próprio, uma mistura de jargão tecnológico, filosofia de botequim elevada a níveis estratosféricos de autoimportância e uma crueldade casual que define suas interações. Há momentos de brilhantismo satírico genuíno, onde a hipocrisia e o vazio moral desses homens são expostos com precisão cirúrgica. Vemos isso na forma como discutem o colapso social com a mesma trivialidade com que escolheriam um vinho caro, ou nas justificativas pseudo-intelectuais para suas ações mais questionáveis.

Contudo, a narrativa tropeça onde os diálogos brilham. O filme muitas vezes parece mais um experimento de pensamento estendido do que uma história coesa. A sensação de estagnação permeia a maior parte da projeção; os personagens circulam pelo cenário opulento, debatendo ética, legado e tecnologia, mas a trama central avança a passos lentos, quase relutantes. Falta um senso de urgência interna que vá além da crise externa convenientemente mantida à distância. A direção de Armstrong, embora competente em criar uma atmosfera claustrofóbica e intencionalmente desconfortável, por vezes parece presa à sua própria premissa. A câmera observa, quase clinicamente, mas raramente injeta a energia cinematográfica necessária para elevar o material além de uma peça teatral filmada. O ritmo irregular é outro ponto fraco; enquanto algumas cenas crepitam com tensão e humor negro, outras se arrastam, perdendo o espectador em discussões que parecem circulares e, por fim, tediosas, especialmente no terço final, onde a narrativa parece buscar uma resolução que não se conecta organicamente com o desenvolvimento anterior.


Titãs da Tecnologia ou Caricaturas Vazias?

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O elenco é, sem dúvida, um dos maiores trunfos de Mountainhead. Steve Carell entrega uma performance contida e melancólica como Randall, o investidor bilionário que encara a própria mortalidade e busca uma solução tecnológica para transcendê-la. Carell navega com habilidade entre o patético e o assustador, mostrando vislumbres da humanidade fraturada por trás da fachada de poder. Cory Michael Smith é igualmente eficaz como Venis, o CEO de uma rede social cujas criações de IA (deepfakes) estão ativamente desestabilizando o mundo. Smith incorpora a arrogância fria e a desconexão calculada do personagem, tornando-o repulsivo, mas crível em sua autoconfiança delirante. Ramy Youssef, como Jeff, o desenvolvedor com uma consciência tardia e fragmentada, oferece um contraponto necessário, embora seu personagem por vezes pareça mais um dispositivo narrativo para expor a moralidade dúbia dos outros do que uma figura tridimensional por si só.

Jason Schwartzman, como Souper (cujo nome real, Hugo Van Yalk, adiciona uma camada de pretensão), completa o quarteto principal. Schwartzman traz sua energia peculiar e timing cômico para o papel, mas Souper, assim como os outros, corre o risco de se tornar uma coleção de tiques e frases de efeito em vez de um personagem plenamente realizado. O problema central reside no roteiro de Armstrong: embora os diálogos sejam afiados, a caracterização muitas vezes pende para a caricatura. Sentimos que estamos assistindo a arquétipos da elite tecnológica – o moribundo obcecado por legado, o sociopata digital, a consciência relutante, o excêntrico imprevisível – em vez de indivíduos complexos. Falta a profundidade e a nuance que tornaram os personagens de Succession tão fascinantes. Aqui, a sátira por vezes sacrifica a humanidade, tornando difícil para o espectador se conectar ou mesmo se importar genuinamente com o destino desses homens, por mais desprezíveis que sejam.


Poder, Vácuo Moral e a Sombra de Ayn Rand

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Tematicamente, Mountainhead mergulha em águas profundas e turbulentas. O filme é uma exploração contundente do poder absoluto e seu efeito corrosivo sobre a moralidade. Estes homens, isolados em sua torre de marfim tecnológica, representam o ápice de um sistema que recompensa a inovação a qualquer custo, divorciada de qualquer senso de responsabilidade ética ou social. A crise que se desenrola lá fora não é um evento aleatório, mas uma consequência direta, ainda que talvez não intencional, de suas próprias ambições e criações. A forma como eles reagem – com uma mistura de negação, racionalização e tentativas fúteis de controle – expõe um vácuo moral assustador.

A referência implícita (e por vezes explícita, no nome da propriedade) a Ayn Rand e sua filosofia objetivista adiciona outra camada de análise. O filme parece zombar da ideia do indivíduo excepcional e autossuficiente, retratando esses supostos “titãs” como figuras profundamente falhas, inseguras e, em última análise, destrutivas. Não há heroísmo em sua busca por poder ou imortalidade digital; há apenas egoísmo e uma desconexão profunda da realidade humana. Mountainhead questiona a própria natureza do progresso tecnológico quando desvinculado de valores humanistas, sugerindo que a busca incessante por controle e transcendência pode levar não à utopia, mas à distopia. A tensão entre a tradição (a inevitabilidade da morte, a responsabilidade social) e a modernidade (a busca pela imortalidade digital, a disrupção tecnológica) é palpável, embora a conclusão do filme possa deixar o espectador com mais perguntas incômodas do que respostas satisfatórias.


Veredito Final: Uma Sátira Afiada ou um Eco Cínico?

Mountainhead é um filme que provoca e perturba, mas nem sempre satisfaz. Sua ambição é inegável, e a habilidade de Jesse Armstrong para o diálogo cáustico e a observação social afiada está presente. O elenco entrega performances sólidas, ancorando a narrativa mesmo quando ela ameaça se dissipar em sua própria verborragia cínica. No entanto, o filme luta para escapar da sombra de Succession e para se estabelecer como uma obra cinematográfica autônoma e totalmente bem-sucedida. A falta de desenvolvimento narrativo consistente e a tendência a reduzir personagens a caricaturas limitam seu impacto.

É uma sátira que acerta alguns alvos com precisão brutal, mas que, em outros momentos, parece contente em apenas reafirmar o óbvio: bilionários da tecnologia podem ser pessoas terríveis e desconectadas. Para aqueles que apreciam o humor negro e a crítica social implacável de Armstrong, Mountainhead oferece momentos de brilhantismo desconfortável. Contudo, sua natureza episódica e seu ritmo irregular podem frustrar espectadores em busca de uma experiência cinematográfica mais coesa e emocionalmente envolvente. É um espelho que reflete as fraturas da nossa era tecnológica, mas cuja imagem, por vezes, parece tão vazia quanto os homens que ele retrata.

Nota do IMDb: 5.5/10

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